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Cristina de Luca

Guerra contra as fraudes na publicidade online começa a dar resultado

Cristina De Luca

16/06/2017 10h11

Há pouco mais de um ano, a Associação Nacional dos Anunciantes (ANA) divulgou um relatório sobre a transparência de mídia digital nos EUA. De lá para cá, o Trustworthy Accountability Group (TAG) e o IAB declararam guerra à fraude, em todo o mundo. Nos últimos 12 meses, os maiores alvos da cruzada por transparência na propaganda online foram as compras de mídia programática e as botnets criadas pelos fraudadores.

Para as ad networks, por exemplo, é uma tarefa complicada rastrear e identificar fraudes realizadas por botnets como a Xindi  (que no fim de 2015 contava com uma rede de 8 milhões de computadores infectados, em mais de 6 mil empresas),  porque os espaços de banner são muitas vezes comprados e revendidos por agregadores de tráfego que trabalham regularmente no mercado de redes online de publicidade.

Os criadores dos sites fantasmas acessam as ad networks e vendem o espaço de publicidade dos seus sites para essas redes. O fraudador usa o código fornecido pela ad network para carregar o banner (as chamadas "ad tags") nas páginas do site fantasma. Como tais sites são visitados apenas por robôs e não por seres humanos, todos os views (ou impressões) dos banners acabam gerando a ilusão de grande volume de visibilidade para os anúncios, quando na verdade ela não existe.

No caso da Xindi, a fraude ia além dos sites fantasmas. Seus criadores exploravam uma vulnerabilidade nos protocolos das redes de publicidade e faziam com que elas achassem que os banners estavam sendo exibidos em grandes sites oficiais de notícias, quando na verdade estavam sendo exibidos nos sites fantasmas.

Mas será que as ações propostas pela ANA há um ano já surtiram efeito? A resposta, felizmente, é sim.

Um novo estudo da entidade, em conjunto com a White Ops, descobriu que os comerciantes estão vendo algum progresso em sua guerra contra fraudes publicitárias. O terceiro relatório anual da Bot Baseline, divulgado no fim de maio, revelou que as perdas econômicas devido à fraude de bots atingiram US$ 6,5 bilhões globalmente em 2017. Volume 10% inferior aos US $ 7,2 bilhões relatados no estudo do ano passado.

O estudo baseia-se em uma análise da atividade de publicidade digital de 49 membros da ANA entre outubro de 2016 e janeiro de 2017. Extrapolando os resultados dos participantes para o mercado global global, as perdas com fraude totalizariam US$ 3,3 bilhões em 2017 – cerca de metade dos US$ 6,5 bilhões projetados pelo mercado.

O processo de compra de tráfego de fontes inorgânicas continua sendo o principal fator de risco para a fraude. O relatório identificou 3,6 vezes mais fraudes de publicidade proveniente deste tipo de tráfego. Em compensação, a fraude móvel foi menor que o esperado. No geral, os participantes viram menos de 2% da atividade fraudulenta em ambientes de aplicativos e compras na web móvel. Isso não inclui fraudes em vídeo da Web móvel ou fraude de pay per click, que permanecem altas.

Estudos anteriores mostraram um risco de fraude consistentemente maior em mídia programática. Mas isso mudou. Muitos participantes do estudo observaram taxas de fraude comparáveis entre a compra programática e a compra direta. O motivo? Segundo a ANA, muitas plataformas programáticas instituíram sofisticados controles de segurança contra o abastecimento de tráfego, eliminando atores ruins e desencorajando editores flertarem com fontes de tráfego de maior risco.

E a partir deste mês, uma ferramenta tecnológica desenvolvida pelo IAB Tech Lab, chamado ads.txt promete tornar a prática, spoofing de domínio muito mais difícil de realizar. Após um período de comentários públicos de 30 dias que termina em 19 de junho, os compradores poderão usar os dados da ads.txt para filtrar os vendedores de inventário não autorizados. Basta que os editores coloquem um arquivo de texto em seu site listando todas as trocas com as quais eles trabalham. Os compradores enviam rastreadores web para explorar os sites dos editores e coletar as listas. Os DSPs podem optar por filtrar o inventário para que os compradores passem apenas pelas trocas listadas.

O Google é um dos grandes players participante do desenvolvimento da iniciativa ads.txt.

"É bom ver que "os profissionais de marketing em todo o mundo estão adotando estratégias e táticas para combater a fraude em anúncios digitais", diz Bob Liodice, CEO da ANA. "Este é um indicador poderoso de que a guerra contra a fraude em anúncios digitais pode ser vencida por aqueles que estabelecem controles e protocolos adequados. E essa é uma notícia excepcionalmente boa para as comunidades de publicidade, marketing e mídia em todo o mundo", completa ele.

Para que isso aconteça, no entanto, é preciso manter-se no ataque.

"Apesar da proliferação de mecanismos de detecção de fraude, os bots continuam se tornando mais sofisticados e evasivos", afirma Michael Tiffany, CEO da White Ops. "Estamos satisfeitos por ver taxas de fraude publicitária declinar. Mas, como esses declínios são relativamente modestos, é fundamental que aqueles afetados por essas ameaças permaneçam vigilantes". completa.

Como?

"As questões de transparência têm continuamente atormentado a indústria da publicidade desde o ano passado. Mas os profissionais de propaganda e marketing ainda precisam recuperar o poder e adotar tecnologias que possam dar o que eles querem – transparência, eficiência, efeito e velocidade – em vez de usar os serviços opacos e antiquados que usam hoje ", opinou recentemente Henrik Busch, diretor gerente e fundador da Blackwood Seven. "Se houver algum movimento positivo no que diz respeito a questões de transparência e fraude, é vital que os anunciantes o sigam e adotem tecnologias que permitam pressionar por melhores padrões da indústria, juntamente com os editores", completa.

"Um mercado transparente e direto é o único mercado que pode escalar e sobreviver a longo prazo", opina John Donahue, chefe do departamento de produtos e marketing da Sonobi. "Alguns dos nossos parceiros estão fortemente empenhados nessa frente, para garantir que um mercado direto, justo e transparente seja o único mercado a receber investimentos".

Mas ainda há um longo caminho a percorrer.

"Há muito menos ação do que deveria haver. Quando você olha para o relatório da ANA, fica claro que os dólares de anúncios estão se movendo rapidamente para o ecossistema social, e esta é uma área que precisa de mais transparência", opina Jason Beckerman, CEO e fundador da Unified. "Hoje, mais da metade dos profissionais de marketing não tem nenhuma transparência ou controle de seus conjuntos de dados de publicidade social. Isso torna as marcas incrivelmente comprometidas com seus parceiros de agência, limitando a portabilidade de dados e colocando em risco seu retorno comercial com os gastos em publicidade."

O que fazer?
Na opinião da ANA, os compradores devem insistir na transparência de todos os fornecedores e editores sobre fontes de tráfego e criar RFPs e pedidos de inserção que exijam que os editores identifiquem todas as fontes de tráfego de terceiros.

Entre as recomendações deste último relatório está rejeitar o pagamento no tráfego não humano nos contratos de mídia: as ordens de inserção devem incluir uma cláusula específica de que os compradores só pagarão por impressões não bot.

A ANA também faz um apelo para que todas as grandes empresas de mídia digital passem a trabalhar com empresas de detecção de fraude credenciadas pela MRC, como as soluções da própria White Ops.

"O Santo Graal agora é garantir que você esteja comprando um usuário real e um site real", afirma Alanna Gombert, GM do IAB Tech Lab.

No Brasil
O IAB Brasil criou um Guia de Combate à Fraude. Três recomendações dele, aliás, são sempre objeto de debates acalorados: (1) pedir transparência de todas as empresas envolvidas; (2) seguir o caminho do dinheiro investido, se possível, determinando a responsabilidade de cada um no processo como um todo; (3) e, por último, exigir métricas variadas e desconfiar de números que sejam difíceis de justificar.

Há também um webinar gratuito, disponível no site do IAB Brasil, que vale assistir. Que tal aproveitar o feriado?

Sobre a autora

Cristina De Luca é jornalista especializada em ambiente de produção multiplataforma. É diretora da ION 89, startup de mídia com foco em transformação digital e disrupção. Foi diretora da área de conteúdo do portal Terra; editora-executiva da área de conteúdo da Globo.com; e editora-executiva da unidade de Novos Meios da Infoglobo, responsável pela criação e implantação do Globo Online. Foi colunista de tecnologia da Rádio CBN e editor-at-large das publicações do grupo IDG no Brasil. Master em Marketing pela PUC do Rio de Janeiro, é ganhadora do Prêmio Comunique-se em 2005, 2010 e 2014 na categoria Jornalista de Tecnologia.

Sobre o blog

Este blog, cujo nome faz referência à porta do protocolo Telnet, que é o protocolo de comunicação por texto sem criptografia, traz as informações mais relevantes sobre a economia digital.