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Cristina de Luca

A corte do Google e do Facebook à mídia tradicional segue firme e forte

Cristina De Luca

24/08/2017 21h50

Na batalha pela afeição da mídia tradicional, Facebook e Google fizeram uma série de anúncios esta semana.

O Facebook vai receber uma atualização, ainda nesta semana, para deixar mais claro de onde vêm as notícias que estão sendo lidas na plataforma incluindo logotipos.

"Essa atualização surgiu de conversas com editoras do mundo inteiro. No futuro, nosso objetivo é ter a logo da empresa de mídia perto de cada artigo no Facebook, para que todos saibam mais sobre o que estão lendo",  disse Andrew Anker, gerente de produto do Facebook, em um post oficial no blog da empresa.

A identificação visual é uma das formas encontradas pela rede social para combater notícias falsas. O objetivo é fazer com que as  pessoas possam identificar melhor  e mais facilmente as fontes de distribuição de notícias na plataforma. Espera-se que a identificação visual possa tranquilizar os usuários de que o conteúdo vem de uma fonte respeitável.

Os veículos agora poderão fazer o upload de várias versões de seus logotipos a partir de uma nova Biblioteca de Ativos de Marca, para que os logotipos possam aparecer ao lado de seu conteúdo no Facebook.

Inicialmente,  esses logotipos aparecerão exclusivamente nos artigos em Trendings (assuntos mais comentados) e na Busca, mas o objetivo final é estendê-los a todos os lugares onde as pessoas consomem notícias em nossa plataforma.

Uma pesquisa mostrou que, quando as pessoas veem um link para um artigo, pode ser difícil associá-lo a uma determinada fonte. Um estudo recente do Pew Research Center descobriu que apenas 56% dos entrevistados pôde lembrar da fonte de um novo link visto em sites sociais.

Ao exibir logotipos dos veículos ao lado dos links de seus artigos, o Facebook também que  tornar mais fácil para os veículos ampliar sua identidade de marca na rede social, aumentando a visibilidade das pessoas em relação à fonte de conteúdo que elas veem no Facebook, para que elas possam decidir melhor o que ler e compartilhar.

"Eventualmente, nosso objetivo é colocar o logotipo de uma editora ao lado de cada artigo no Facebook para que todos possam entender mais sobre o que estão lendo", disse Mark Zuckerberg, CEO do Facebook, a respeito da novidade.  "Dar voz às pessoas não é suficiente sem ter organizações dedicadas a descobrir novas informações e analisá-las", completou. "Nós vamos continuar experimentando diferentes formas de apoiar o setor de notícias e garantir que os repórteres e editores de todo o mundo possam continuar fazendo seu importante trabalho".

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Na sequência deste anúncio, Zuckerberg também fez um post em seu perfil na rede social detalhando um pouco mais como será o programa de notícias pagas no Facebook, no qual reafirma que a intenção da plataforma é valorizar o trabalho jornalístico que é publicado em suas páginas.

O Facebook planeja recompensar os jornalistas, editoras e veículos de comunicação, sem embutir taxas ou cortar porcentagens de quem produz. "Se as pessoas se inscreverem, após verem as notícias no Facebook, todo o dinheiro irá para os autores, que trabalham duro para descobrir a verdade, e o Facebook não ficará com uma parte", prometeu. Também revelou que começará em grupos selecionados de empresas nos EUA e Europa "até o fim do ano".

No mês passado, o Facebook já havia revelado planos para um serviço de assinatura digital para editores de notícias, que permitirá que as editoras limitem o número de artigos que os usuários do Facebook podem ver gratuitamente.

O sistema permitirá que os editores direcionem o tráfego do Facebook para seus próprios sites, onde eles podem vender assinaturas  diretamente. A autenticação permitirá que os usuários continuem acessando o conteúdo através do feed de notícias do Facebook.

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O Google, por sua vez, também está trabalhando em um serviço de assinatura de notícias online que permitirá que os editores cobrem  dos leitores pelo acesso ao conteúdo.

Hoje, a política do primeiro clique faz com que notícias pagas dos sites do The New York Times e Financial Times será gratuito, desde que ele seja originado a partir da busca do Google. Os editores liberam três artigos gratuitos por dia para não assinantes, para não terem seus conteúdos rebaixados nos resultados de busca.

Essa política do "primeiro clique livre" do Google ajudou a garantir que não-pagantes não fossem sufocados por paywalls quando clicavam em artigos de notícias após buscas. O argumento do Google era o de que as amostras gratuitas levariam a um aumento das assinaturas.

Mas, com a exceção de algumas publicações, as assinaturas online não decolaram como o pretendido e as empresas de mídia, como a News Corp, controladora do The Wall Street Journal, passaram a reclamar cada vez mais que o uso dessas amostras estava reduzindo as vendas.

Este ano, o Wall Street Journal deixou de respeitar a política do Google. E viu a queda de seus conteúdos no ranking da busca do Google foi compensada com um aumento no número de assinantes.

Agora, o Google diz estar trabalhando com o NYT para diminuir esse número, colocando mais pressão sobre os leitores interessados ​​em assinar o conteúdo. A ideia é promover um relaxamento da política  do "primeiro clique livre". Os editores poderão escolher a quantidade ou mesmo decidir se disponibilizarão artigos gratuitos que desejam oferecer aos usuários do Google.

E também passar a oferecer  um software de assinaturas, já  em desenvolvimento, para impedir que o Wall Street Journal e outras publicações retenham conteúdo valioso.

Além disso, o Google está testando ferramentas de pagamentos online para permitir que os editores realizem transações simplificadas com assinantes, inclusive através de pagamento móvel.  O objetivo é facilitar as compras rápidas que podem levar apenas um clique.

O Google diz estar trabalhando também para ajudar os editores a alcançar novas audiências e segmentar possíveis assinantes através de um conjunto de novas soluções, que também ajudarão a avaliar a vontade de assinar o conteúdo e a sensibilidade aos preços dos potenciais assinantes.

Até agora, a gigante das buscas não divulgou os termos de compartilhamento de receita para suas colaborações atuais com NYT e FT , ou o que poderia ser oferecido a futuros editores parceiros.

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Os dois anúncios voltaram a provocar debates acalorados sobre o uso das plataformas como tábua de salvação da mídia tradicional. É evidente que as duas gigantes da internet têm todo o interesse em ajudar as publicações de qualidade, especialmente enquanto lutam para se livrar de uma série de acusações de permitir que notícias falsas não só prosperem, como sejam promovidas indiscriminadamente. Se a mídia tradicional usar bem as novidades anunciadas, a imagem do Google e do Facebook melhora. E a receita com publicidade também.

Por enquanto, a mídia tradicional não tem muito com o que se preocupar, a não ser experimentar as novidades, com cuidado e parcimônia, "como forma de ampliar  alcance  para ganhar novos leitores e, se for o caso, assinantes", opina Sean Hargrave, do Media Post. Se o mundo digital é das redes sociais e dos dispositivos móveis, é lá que as notícias também devem estar.

A dúvida, que persiste, é em relação à dosagem do remédio proposto pelas plataformas. A  dose certa pode ser benéfica, mas a errada pode matar.

O quanto do conteúdo produzido pode e deve ser ofertado através das ferramentas de Google e Facebook, e o quanto será preciso reservar para ampliação da relevância e da monetização das próprias propriedades (no caso sites e apps de cada veículo de mídia)?

Só o tempo dirá.

Sobre a autora

Cristina De Luca é jornalista especializada em ambiente de produção multiplataforma. É diretora da ION 89, startup de mídia com foco em transformação digital e disrupção. Foi diretora da área de conteúdo do portal Terra; editora-executiva da área de conteúdo da Globo.com; e editora-executiva da unidade de Novos Meios da Infoglobo, responsável pela criação e implantação do Globo Online. Foi colunista de tecnologia da Rádio CBN e editor-at-large das publicações do grupo IDG no Brasil. Master em Marketing pela PUC do Rio de Janeiro, é ganhadora do Prêmio Comunique-se em 2005, 2010 e 2014 na categoria Jornalista de Tecnologia.

Sobre o blog

Este blog, cujo nome faz referência à porta do protocolo Telnet, que é o protocolo de comunicação por texto sem criptografia, traz as informações mais relevantes sobre a economia digital.