Topo

Cristina de Luca

TSE quer apoio do Exército para combater crimes eleitorais na Internet

Cristina De Luca

12/10/2017 11h35

"Como a nova legislação vai jogar muito peso nas redes sociais, nas próximas eleições, é fundamental contar com um comitê que se preocupe também com os crimes eleitorais cibernéticos", disse o ministro da Defesa, Raul Jungmann, antes da reunião realizada na última terça-feira, 10/10, com presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes.

Desde 1994, a Justiça Eleitoral conta com o apoio logístico das Forças Armadas para locais de difícil acesso ou em situação de violência durante as eleições. Esta semana, Gilmar Mendes manifestou interesse em fazer um convênio com o Exército Brasileiro, que tem um centro de defesa cibernética que é referência do Brasil, para apoiar também no combate aos crimes eleitorais na Internet.

A preocupação declarada das autoridade é o monitoramento da atuação do crime organizado no financiamento das campanhas. Nas eleições municipais de 2016 já foi verificado algum tipo de problema em 300 mil CPFs do total de 730 mil brasileiros que fizeram doações para candidatos e que serão em maior número nas eleições de 2018, por conta da liberação do crowdfunding para financiamento das campanhas.

O presidente do TSE está especialmente preocupado com a "caça a CPFs", quando pessoas físicas são cooptadas a fazer doações em seu nome, mas usando dinheiro do crime organizado.

"Estamos conversando com todas as autoridades da Receita [Federal], do Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras], da Abin [Agência Brasileira de Inteligência] e estamos tomando todas as cautelas e temos o novo modelo de crowdfunding, que vamos analisar com todo cuidado. Vamos combinar ações que permitam monitoramento quase online dessas doações" — disse o ministro Gilmar Mendes a jornalistas na última terça-feira.

A lista de crimes cibernéticos é grande
Mas no campo digital, outra fiscalização terá que ser intensa: a do tal impulsionamento da propaganda política nas redes sociais. No Facebook, mas também no Google, no Youtube e no Twitter, a prática merece atenção, conforme tem demonstrado a investigação sobre a suspeita de manipulação russa nas eleições presidenciais americanas.

A possibilidade de participação do Exército nesse monitoramento é algo que requer muito cuidado.

Monitorar e analisar o que as pessoas estão falando em seus perfis e na fan Page dos candidatos pode revelar muito sobre as correntes ideológicas, individuais e em grupos. No marketing político, por exemplo, o monitoramento das mídias sociais é essencial para compreender a tendência do eleitorado.

Através do monitoramento também é possível identificar quem são as pessoas mais influentes nas redes sociais, para disseminação de mensagens positivas, ou negativas.

Outro problema recorrente durante as campanhas políticas – e novamente o ocorrido nos Estados Unidos serve de exemplo – é o uso de perfis falsos nas redes sociais para veiculação de conteúdo eleitoral. Ou seja, para discutir e comentar a política e temas sensíveis ao pleito, através de codinomes, niknames, etc.

Em 2014 e 2016, a militância virtual ganhou um exército de perfis forjados para ajudar na propagação da imagem que os políticos gostariam de alcançar.

Assim como o anonimato, essa é uma prática ilegal, explicitada como tal na legislação eleitoral brasileira que estará em vigor em 2018. Está no texto da lei: "Não é admitida a veiculação de conteúdos de cunho eleitoral mediante cadastro de usuário de aplicação de internet com a intenção de falsear identidade."

Geralmente, perfis falsos são usados para aumentar a exposição de uma fraqueza de determinado candidato, de algum "flanco" deixado mais aberto e exposto nas redes. E até, o que é mais grave, "inventar" ou "aumentar" algum problema pelo qual o candidato será responsabilizado.

Esse é outro ponto que merecerá uma fiscalização permanente.

Será que a Justiça Eleitoral está preparada para isso? Agirá só mediante denúncias, ou a ajuda do Exército também será usada para fazer um monitoramento mais ativo?

Experiência reconhecida
Durante os jogos olímpicos de 2016, cerca de 200 especialistas do Centro de Defesa Cibernética (CDCiber), do Exército brasileiro, e de outros órgãos civis e militares do País, tiveram a missão de garantir a segurança na internet.As ameaças mais claras eram o ativismo hacker e o crime cibernético. As mesmas intensificadas no período eleitoral.

O CDCiber, que atua no âmbito do Ministério da Defesa, oferece serviços de análise de riscos, detecção automática de incidentes, análise dos incidentes, difusão de alertas, recomendações e estatística, entre outros, 24 horas por dia.

Militares da Marinha, Exército e Aeronáutica trabalham em conjunto no CDCiber e apoiam não só as Forças Armadas, mas mantêm ações colaborativas com órgãos governamentais que participam da proteção do ambiente cibernético brasileiro e que também podem ser alvos de ameaças.

Entre eles estão Polícia Federal, Agência Nacional de Telecomunicações, Agência Brasileira de Inteligência e até mesmo órgãos acadêmicos, como a Universidade de Brasília.

A preocupação
Portanto, desde a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos o Exército brasileiro dispõe de um verdadeiro arsenal para monitoramento das redes sociais, usado com finalidades pontuais, até prova em contrário, salvaguardadas as suas atribuições no combate ao crime cibernértico. Em especial após as denúncias de espionagem americana reveladas por Edward Snowden.

Por isso, a atuação do Exército no campo virtual nas Eleições de 2018 é algo que já começa a preocupar os defensores do estado democrático de direito.

Há tempos, algumas organizações vêm alertando para a importância de evitar que, sob a égide da segurança, o próprio Estado incorra em violações sistemáticas de direitos fundamentais de milhões de indivíduos que usam tecnologias da informação e comunicação para práticas cotidianas e essenciais ao exercício da democracia. Em especial, aquelas garantias previstas na Constituição Federal: a liberdade de expressão, do sigilo de comunicações e da privacidade e proteção de dados pessoais no âmbito da Internet.

As atenções estão voltadas, portanto, para uma segunda reunião convocada pelo ministro Gilmar Mendes para a próxima semana, com os ministros da Justiça, Torquatro Jardim, do GSI, general Sérgio Etchegoyen, da Defesa e com a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, para criar um grupo de trabalho que começará desde já a executar ações para, segundo o presidente do TSE, evitar a infiltração do crime organizado na política. Que assim seja.

Sobre a autora

Cristina De Luca é jornalista especializada em ambiente de produção multiplataforma. É diretora da ION 89, startup de mídia com foco em transformação digital e disrupção. Foi diretora da área de conteúdo do portal Terra; editora-executiva da área de conteúdo da Globo.com; e editora-executiva da unidade de Novos Meios da Infoglobo, responsável pela criação e implantação do Globo Online. Foi colunista de tecnologia da Rádio CBN e editor-at-large das publicações do grupo IDG no Brasil. Master em Marketing pela PUC do Rio de Janeiro, é ganhadora do Prêmio Comunique-se em 2005, 2010 e 2014 na categoria Jornalista de Tecnologia.

Sobre o blog

Este blog, cujo nome faz referência à porta do protocolo Telnet, que é o protocolo de comunicação por texto sem criptografia, traz as informações mais relevantes sobre a economia digital.