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Cristina de Luca

O poder do Google e do Facebook te assusta? E o da Inteligência Artificial?

Cristina De Luca

10/11/2017 01h26

Do Web Summit, que acontece esta semana Lisboa, ao Congresso americano, passando pelo Fórum Econômico Mundial, é crescente o clamor em todo mundo para que a atuação das gigantes da Internet, especialmente do Google e do Facebook, seja regulada.

"Em termos econômicos, essas companhias parecem ter caído na definição clássica de monopólios", disse na segunda-feira à Reuters o organizador da Web Summit, Paddy Cosgrave.

"Não só guiam o que vemos, lemos e compram regularmente, mas o domínio específico do mercado de informação agora exige que consideremos seu papel também na integridade de nossa democracia", afirmou  hoje o senador democrata Al Franken, para quem as gigantes da Internet devem ser mantidas no mesmo estilo de regras de neutralidade da rede que as principais empresas de telecomunicações.

"O poder dessas empresas às vezes me assusta", disse Franken, citando o senador John Kennedy, durante um evento realizado pelo think tank Open Markets Institute."Nenhuma empresa deve ter o poder de escolher e escolher o conteúdo que chega aos consumidores e que não. E o Facebook, o Google e a Amazon, como ISPs, devem ser neutros no tratamento do fluxo de informações legítimas e comércio em sua plataforma".

A bronca geral é com o uso pouco transparente dos algoritmos, agora também nas campanhas eleitorais, para envolver os eleitores a pretexto de ajudá-los a estar mais informados sobre questões políticas importantes… O resultado final, no entanto, vem sendo o aumento deliberado da desinformação, através do emprego de técnicas massivas de contrainformação.

No Reino Unido, enxames massivos de bots políticos foram usados ​ para espalhar informações erradas e notícias falsas nas redes sociais que influenciaram o Brexit. O mesmo aconteceu durante as eleições presidenciais dos EUA em 2016, agora sob investigação do Congresso americano, e também várias outras eleições políticas importantes ao redor do mundo.

Contra esse efeito perverso, não bastam  iniciativas tecnológicas baseadas em Inteligência Artificial, como o Factmata e o Avantgarde Analytics, segundo os mais críticos. É preciso apelar para a regulação, capaz de restringir a propaganda computacional e promover a proteção de dados e responsabilização algorítmica, ainda que regras mais rígidas para evitar o uso abusivo de Machine Learning em contextos políticos possam prejudicar o seu desenvolvimento, em geral, e atrasar conquistas positivas relevantes.

Não por acaso, no fim de novembro o Fórum Econômico Mundial (WEF) já havia divulgado um estudo no qual seu Conselho de Direitos Humanos adverte que as empresas de tecnologia estão arriscando colocar em pauta regulamentações que limitam a liberdade de expressão, ao se recusarem sistematicamente  a assumir "um papel de autogovernança mais ativo". O relatório recomenda que as empresas realizem análises internas mais detalhadas de como seus serviços podem ser mal utilizados e implementem mais controle humano do conteúdo publicado em suas plataformas.

O assunto autogovernança está inserido na reunião anual do Conselho da Agenda Global do Fórum Econômico Mundial, que acontecerá de 11 a 12 de novembro em Dubai. O Conselho é a principal rede de conhecimento interdisciplinar do mundo dedicada a pensar nosso futuro digital, especificamente as implicações da Quarta Revolução Industrial. (Para quem quiser acompanhar, a hashtag oficial da conferência é# gfc17).

Um dos grande debates, já em andamento, é como podemos restaurar a confiança na tecnologia e reduzir os efeitos negativos de seu uso. A resposta pode estar no aumento da transparência e na análise cuidadosa dos danos e riscos para todas as partes interessadas, extrapolando as questões técnicas, colocando o propósito social antes de tudo. A IEEE Global Initiative for Ethical Considerations in Artificial Intelligence and Autonomous Systems é uma tentativa nessa direção. O FATML.org e a diversity.ai, como lembradas pelo Hermano Vianna, também.

"A história da inovação mostra que, de fato, é muito difícil prever onde uma tecnologia irá liderar e quais aplicativos surgirão de seu uso. No entanto, detectar alertas antecipados de impactos negativos quando surgem não parece ser muito difícil – responder de forma oportuna parece representar um desafio maior", ressalta Hilary Sutcliffe, diretora da iniciativa SocietyInside, que defende o uso ético da tecnologia.

A frase "Nós não sabíamos que as pessoas iriam fazer isso com nossa tecnologia" não pode mais continuar sendo a resposta padrão dos engenheiros no comando das gigantes da Internet, sobretudo das empresas de mídia social, em relação às suas responsabilidades com as consequências de suas inovações, diz ela. E eu assino embaixo.

Especialmente diante do futuro da Inteligência Artificial preconizado pela  "SingularityNET" – explicada no palco da  Web Summit por dois robôs humanoides da Hanson Robotics. O curioso é que a rede subverte a ideia da Singularidade, de que o computador vai se tornar superinteligente e superar os humanos.

"Com a SingularityNET, qualquer pessoa poderá criar um modelo de inteligência artificial e colocá-lo na rede, e qualquer pessoa poderá ter acesso a ele", disse Sophia, que já entrou para a história como o primeiro robô a obter a cidadania de um país.

"Dar Inteligência Artificial para as pessoas, criada pelas pessoas, é o mais importante, para que os humanos se sintam mais confortáveis sobre o desenvolvimento da inteligência artificial e a nanotecnologia", completou o "professor" Einstein, o outro robô da Hanson Robotics. "Espero que os seres humanos sejam capazes de criar um sistema de inteligência positivo, já que há tantos problemas que não conseguem resolver… terrorismo, problemas com o clima, violência…"

"Não queremos um futuro em que a Inteligência Artificial esteja limitada a empresas específicas", frisou o criador da SingularityNET, Ben Goertzel.

Será que em vez da Singularidade teremos a Multiplicidade, como acredita Ronaldo Lemos, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITSrio.org). E saberemos lidar com essas tecnologias generativas aplicando os princípios da responsabilidade, escritabilidade, acuracidade,  auditabilidade e  justiça ou equidade, como prega Virgílio Almeida, Professor Associado ao Berkman Klein Center na Universidade de Harvard e professor titular na UFMG?

Eu estou com o robozinho, Einstein e a pesquisadora do Sandra Cortesi do Berkman Klein Center de Harvard, Sandra Cortesi , que esteve esta semana, no rio, participando do Simpósio Global de Inteligência Artificial e Inclusão promovido pelo ITS: de fato ainda precisamos definir como vamos criar e usar sistemas de Inteligência Artificial, incluindo aí os algoritmos de Machine Learning, preservando direitos. Como vamos lidar com este aumento da capacitação de softwares e máquinas, a enorme aceitação no fluxo de informações em tempo real, o avanço da intelig6encia artificial e as implicações de longo alcance que estes desenvolvimentos terão.

Somos nós que devemos tornar ético o uso das tecnologias. É uma tarefa para todos. Uma questão de toda a sociedade: políticos, legisladores, reguladores… Mas também das companhias que usam nossos dados e devem ser responsáveis por eles.E nossa, que devemos cobrar delas ferramentas para controlar os dados que entregamos a elas. No futuro, quando nossos carros estiverem conectados, nossas casas, precisaremos de mais segurança. Contratos sociais, tratados, regulamentos… Por mínimos que sejam!

Sobre a autora

Cristina De Luca é jornalista especializada em ambiente de produção multiplataforma. É diretora da ION 89, startup de mídia com foco em transformação digital e disrupção. Foi diretora da área de conteúdo do portal Terra; editora-executiva da área de conteúdo da Globo.com; e editora-executiva da unidade de Novos Meios da Infoglobo, responsável pela criação e implantação do Globo Online. Foi colunista de tecnologia da Rádio CBN e editor-at-large das publicações do grupo IDG no Brasil. Master em Marketing pela PUC do Rio de Janeiro, é ganhadora do Prêmio Comunique-se em 2005, 2010 e 2014 na categoria Jornalista de Tecnologia.

Sobre o blog

Este blog, cujo nome faz referência à porta do protocolo Telnet, que é o protocolo de comunicação por texto sem criptografia, traz as informações mais relevantes sobre a economia digital.