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Cristina de Luca

Confiança na mídia cai junto com a credibilidade das plataformas digitais

Cristina De Luca

23/01/2018 22h49

A edição 2018 do Barômetro de Confiança da Edelman traz péssimas notícias para a mídia, em geral. A crise de confiança piorou. E a mídia se tornou a instituição global menos confiável, pela primeira vez desde que o estudo é realizado, com índices abaixo de 50% em 22 dos 28 países pesquisados. A exceção são seis nações em desenvolvimento (Índia, Indonésia, China, Singapura e Emirados Árabes Unidos). Além disso, a pressão sobre a confiança na mídia vem contribuindo para a queda de confiança nos motores de busca e nas mídias sociais.

"As pessoas recuaram para as bolhas de informação auto-organizadas, onde leem apenas aquelas informações com as quais concordam", afirmam os organizadores do estudo. E isso nos levou a viver em um mundo sem fatos e verdade objetiva.

Mas há uma luz no fim do túnel: os pares não são mais a fonte de informação mais acreditada. Há uma confiança renovada em especialistas, especialmente especialistas técnicos e acadêmicos (63 por cento e 61 por cento, respectivamente).

"A preocupação das pessoas com as notícias falsas e sua vontade de ouvir os especialistas mostram que elas anseiam por conhecimento", diz Richard Edelman, presidente e CEO da Edelman.

"Em um mundo onde os fatos estão sob cerco, fontes credenciadas estão se tornando mais importantes do que nunca", disse Stephen Kehoe, Global Chair de  Reputação da empresa. "Há problemas de credibilidade para plataformas e fontes. A confiança das pessoas neles está em colapso, deixando um vácuo e uma oportunidade para os especialistas de boa-fé". Incluindo, entre eles, os jornalistas. A credibilidade dos jornalistas aumentou substancialmente (12 pontos percentuais, comparado a 2017).  Em 20 dos 28 países o Barômetro registrou aumento de dois dígitos na credibilidade dos jornalistas.

Entre as outras "vozes com autoridade", mais confiáveis, estão os CEOs, que registraram ganho de confiabilidade de sete pontos percentuais, na variação anual. Especialistas técnicos, analistas do setor financeiro e empresários bem-sucedidos também passaram a registrar níveis de credibilidade de 50% ou mais.

De acordo com o estudo, a confusão sobre a credibilidade das notícias está conectada à ampla definição de mídia que os entrevistados do Barômetro possuem hoje. Alguns deles consideram que as plataformas fazem parte da "mídia" – incluindo redes sociais (48 por cento) e motores de busca (25 por cento) – ao lado do jornalismo (89 por cento), que inclui editores e organizações de notícias.

O hiato global de oito pontos entre o jornalismo (59%) e plataformas (51%) como fonte confiável de notícias e informações é a maior disparidade em sete anos.  E vários  fatores estão levando a esse paradoxo.

De acordo com o Barômetro, quase dois terços das pessoas dizem que recebem suas novidades através de plataformas tecnológicas. Essas câmaras de eco frequentemente auto referenciadas criaram um ambiente onde as crenças têm o mesmo peso dos fatos reais. Metade dos entrevistados consome menos notícias de fontes tradicionais (menos de uma vez por semana).

A maioria dos entrevistados acredita que as organizações de notícias estão excessivamente concentradas em atrair grandes públicos (66 por cento) com notícias em tempo real (65 por cento) e notícias políticas (59 por cento).

Quase seis em cada 10 entrevistados concordam que as organizações de notícias estão politizadas e quase um em cada dois concorda que são elitistas. Quase dois terços concordam é difícil para as pessoas, em geral, distinguir o bom jornalismo daquele tendencioso e parcial. E 59% que é mais difícil hoje  dizer se uma notícia foi produzida por uma mídia respeitada. (É nesse cenário que o Facebook decidiu perguntar aos leitores qual em quais veículos eles confiam).

A desinformação está na ordem do dia. E, segundo os organizadores do estudo, é uma questão que nenhuma instituição – mídia, governo, corporações ou ONGs – pode resolver sozinha. Nem as plataformas de tecnologia, quase sempre apontadas como as grandes culpadas por tudo isso.

"Estamos diante de uma consciência global em relação à noção de desinformação. As pessoas estão questionando a natureza da verdade. Não sabem no que acreditar", diz Ben Boyd, presidente da propriedade intelectual da Edelman.

Quase sete em cada dez entrevistados se preocupam com notícias falsas e informações falsas sendo usadas como uma arma.

"A confiança só será recuperada quando a verdade voltar para o centro do palco. As instituições devem atender o apelo do público para fornecer informações precisas e oportunas e se juntarem ao debate público. Os meios de comunicação não podem fazê-lo sozinhos por causa de restrições políticas e financeiras. Todas as instituições devem contribuir para a educação da população", argumentou Richard Edelman, em entrevista ao The Holmes Report.

Resultados do Brasil

O estudo ouviu 33 mil pessoas em 28 países, o Brasil entre eles, de 28 de outubro a 20 de novembro de 2017. O Brasil está entre os países onde confiança caiu, na variação anual.

O Brasil também é o país onde a credibilidade da imprensa e das redes sociais desce ladeira. Mas, ainda assim, os entrevistados acreditam mais do que leem nas plataformas do que nos jornais.

 

Sobre a autora

Cristina De Luca é jornalista especializada em ambiente de produção multiplataforma. É diretora da ION 89, startup de mídia com foco em transformação digital e disrupção. Foi diretora da área de conteúdo do portal Terra; editora-executiva da área de conteúdo da Globo.com; e editora-executiva da unidade de Novos Meios da Infoglobo, responsável pela criação e implantação do Globo Online. Foi colunista de tecnologia da Rádio CBN e editor-at-large das publicações do grupo IDG no Brasil. Master em Marketing pela PUC do Rio de Janeiro, é ganhadora do Prêmio Comunique-se em 2005, 2010 e 2014 na categoria Jornalista de Tecnologia.

Sobre o blog

Este blog, cujo nome faz referência à porta do protocolo Telnet, que é o protocolo de comunicação por texto sem criptografia, traz as informações mais relevantes sobre a economia digital.