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Cristina de Luca

Vetos ameaçam eficácia da Lei de Proteção de Dados, diz Direitos na Rede

Cristina De Luca

15/08/2018 13h11

"Celebramos a sanção ocorrida, fruto de muita luta e pressão social contra os abusos praticados no tratamento de dados pessoais no Brasil. Um passo fundamental para mudar este quadro foi dado e todos os atores e setores envolvidos neste processo merecem nosso reconhecimento público. Porém, não descansaremos enquanto o país não contar com uma legislação efetivamente protetiva e com mecanismos para ser plenamente implementada. Essa é a nossa bandeira."

Foi com esse espírito que a Coalizão Direitos na Rede, que reúne dezenas de entidades da sociedade civil, ativistas e acadêmicos em defesa da Internet livre e aberta reagiu à sanção da Lei Geral de dados Pessoais (agora Lei 13.709/2018).

Em nota pública divulgada agora no início da tarde desta quarta-feira, a Coalizão afirma que os vetos realizados pelo governo federal ao texto aprovado no Parlamento podem comprometer a eficácia da legislação. E se debruça mais sobre aqueles considerados mais preocupantes. Entre eles estão o veto aos artigos que tratam da criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (artigos 55 a 59) e do Conselho Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade, órgão multissetorial vinculado à Autoridade, responsável por propor diretrizes estratégicas e fornecer subsídios para a elaboração de uma política nacional para o setor, assim como para a atuação da própria ANP.

"Durante a cerimônia da sanção, Michel Temer afirmou que não há discordância de mérito com a criação da autoridade e anunciou que enviará em breve ao Congresso Nacional um projeto de lei para corrigir o problema do vício de origem e assim criar a Autoridade de Proteção de Dados. A Coalizão Direitos na Rede espera que o formato de composição da Autoridade, sua autonomia administrativa, suas atribuições e seu modo de funcionamento, assim como a criação, composição e atribuições do Conselho Nacional de Proteção de Dados sejam mantidos no novo PL, da mesma maneira como aprovados originalmente pelos deputados/as e senadores/as, fruto de um longo processo de discussões. Ou seja, qualquer proposta que vier do governo deve preservar o caráter de independência da Autoridade, que só pode cumprir efetivamente seu papel se, ainda que vinculada ao Ministério da Justiça, não fique sujeita a interferências políticas de governo. Do contrário, a efetividade da Lei estará de fato comprometida", diz o texto.

A entidade promete seguir acompanhando de perto a tramitação do novo PL no Legislativo.

Além disso, a Coalizão considera que a justificativa apresentada para o veto ao Artigo 28, que previa publicidade ao uso compartilhado de dados pessoais entre órgãos e entidades de direito público não se sustenta. E explica: "Segundo o Palácio do Planalto, o artigo poderia inviabilizar "ações de fiscalização, controle e polícia administrativa". Ora, a publicidade prevista no Artigo 28 visava dar transparência à comunicação de dados entre órgãos públicos, o que é prática recorrente no poder público, além de um mandamento constitucional previsto no Art. 37 da Carta Maior, apesar de desconhecida pela absoluta maioria da sociedade. Casos de fiscalização e controle internos da administração pública não seriam prejudicados porque as informações a serem publicizadas não incluiriam o detalhamento dos dados pessoais tratados. Infelizmente, quem perde com este veto é o direito do cidadão de saber por onde seus dados estão transitando dentro da administração pública."

Trocando em miúdos, o artigo não impediria que o Ministério da Saúde tornasse público um compartilhamento de dados sobre chikungunya com a Defesa Civil para algum tipo de ação de Saúde Pública. Também não se esperaria uma publicização de compartilhamento de dados em relação ao envio de informações sobre uma determinada pessoa para a CGU, em uma investigação de suspeita de desvio de recursos. Quer dizer, o detalhamento exigido para a publicização na lei, no entendimento da Coalizão Direitos da Rede, não inviabilizaria casos pontuais de polícia administrativa.

ABPDados também se posiciona e cobra agilidade na criação da ANPD
Também na manhã dessa quarta-feira, 15/8, a recém criada Associação Brasileira de Proteção de Dados – ABPDados, publicou um manifesto cobrando agilidade na criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados.

No texto, a entidade se soma às vozes que têm dito que a demora na criação da ANDP,seja por meio de Medida Provisório ou Projeto de Lei,pode tornar a LGPD manca, sem eficácia. E enumera aqueles que ela defende que venham a ser os papeis da autoridade reguladora. A saber:

– Zelar pela proteção dos dados pessoais, nos termos da legislação;

– Zelar pela observância dos segredos comercial e industrial em ponderação com a proteção de dados pessoais e do sigilo das informações;

– Elaborar diretrizes para Política Nacional de Proteção de Dados Pessoais e da Privacidade

– Fiscalizar e aplicar sanções em caso de tratamento de dados realizado em descumprimento à legislação, mediante processo administrativo que assegure o contraditório, a ampla defesa e o direito de recurso; atender petições de titulares de dados;

– Promover na população o conhecimento das normas e das políticas públicas sobre proteção de dados pessoais e das medidas de segurança; promover estudos sobre as práticas nacionais e internacionais de proteção de dados pessoais e privacidade;

– Estimular a adoção de padrões para serviços e produtos que facilitem o exercício de controle dos titulares sobre seus dados pessoais;
– Promover ações de cooperação com autoridades de proteção de dados pessoais de outros países, de natureza internacional ou transnacional;

– Editar regulamentos e procedimentos sobre proteção de dados pessoais e privacidade, assim como sobre relatórios de impacto à proteção de dados pessoais para os casos em que o tratamento representar alto risco para a garantia dos princípios gerais de proteção de dados pessoais previstos nesta Lei;

– Ouvir os agentes de tratamento e a sociedade em matérias de interesse relevante, assim como prestar contas sobre suas atividades e planejamento.

Sobre a autora

Cristina De Luca é jornalista especializada em ambiente de produção multiplataforma. É diretora da ION 89, startup de mídia com foco em transformação digital e disrupção. Foi diretora da área de conteúdo do portal Terra; editora-executiva da área de conteúdo da Globo.com; e editora-executiva da unidade de Novos Meios da Infoglobo, responsável pela criação e implantação do Globo Online. Foi colunista de tecnologia da Rádio CBN e editor-at-large das publicações do grupo IDG no Brasil. Master em Marketing pela PUC do Rio de Janeiro, é ganhadora do Prêmio Comunique-se em 2005, 2010 e 2014 na categoria Jornalista de Tecnologia.

Sobre o blog

Este blog, cujo nome faz referência à porta do protocolo Telnet, que é o protocolo de comunicação por texto sem criptografia, traz as informações mais relevantes sobre a economia digital.