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Cristina de Luca

Doze novos projetos de lei tentam mudar o Marco Civil da Internet

Cristina De Luca

23/04/2019 19h55

Há 5 anos a Lei 12.965/2014, mais conhecida como o Marco Civil da Internet, vem servindo como bastião dos defensores da Internet como ambiente aberto e livre no Brasil. Por todo esse tempo, uma certeza sempre permeou os debates em torno da legislação: a de que o texto aprovado foi o possível, não o ideal. Desde então, muitos congressistas tentam aprovar projetos alterando e/ou aperfeiçoando a legislação. Nesse momento há 12 novos PLs, todos protocolados este ano, tramitando na Câmara (PL 344PL 1363PL 1061PL 1782PL 1267PL 346PL 2205PL 2185PL 2418,  PL 2184, PL1585 e PL 1577) e outros dois, mais antigos, tramitando, um deles, na Câmara (PL 7170/2017) e outro no Senado (PLS 246/2018).

Entre os temas tratados estão a proteção de dados pessoais, o direito ao esquecimento, a retirada de conteúdo do ar sem a necessidade de ordem judicial e o acesso a registros de conexão e à identificação de internautas durante investigações criminais,  também sem a necessidade de ordem judicial. 

Nesse último ponto, o decreto que regulamentou o Marco Civil em 2016 garantiu que a administração pública, mediante determinação judicial, tenha acesso a registros de conexão e dados cadastrais de pessoas ou grupos específicos, que podem ser usados, por exemplo, para saber se um suspeito acessou tal site em determinado dia. Mas os órgãos competentes não podem solicitar dados coletivos e genéricos, como acabou de acontecer na investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco.  A pedido da polícia, a Justiça do Rio de Janeiro determinou a quebra de sigilo de todas as pessoas que pesquisaram no Google o nome da vereadora  e outras expressões associadas à parlamentar dias antes do assassinato, em março do ano passado. O Google alega que o Marco Civil não autoriza a quebra de sigilo de uma gama de pessoas  a partir da mera indicação de palavras-chave pesquisadas.

Três PLs merecem destaque: o do Senado, que dispõe sobre medidas de combate à divulgação de conteúdos falsos (fake news) ou ofensivos, incluindo multa diária de R$ 300 mil para o provedor que descumprir uma ordem judicial para retirada desses conteúdos do ar; o da Câmara (PL 1577) que criminaliza o desenvolvimento, a importação, a venda, a cessão, o empréstimo, a disponibilização e/ou o aluguel de aplicativos ou jogos eletrônicos com conteúdo que incite a violência, também pela rede; e outro, da Câmara (PL 2418), que obriga o monitoramento de atividades terroristas e crimes hediondos a provedores de aplicações de Internet. Todos motivados por fatos ocorridos entre o período eleitoral e o primeiro trimestre deste ano.

Vale lembrar que o Marco Civil da Internet é uma lei principiológica que zela pela liberdade de expressão,  a proteção da privacidade e dos dados pessoais, e a preservação da estabilidade, segurança e funcionalidades da rede, incluindo a chamada neutralidade da rede.  O artigo 9º do Marco Civil estabelece que "o responsável pela transmissão, comutação ou roteamento tem o dever de tratar de forma isonômica quaisquer pacotes de dados, sem distinção por conteúdo, origem e destino, serviço, terminal ou aplicação".

Especialistas olham as tentativas de mudança com muito cuidado. Em muitos casos, o perigo de retrocesso é real.

Para comemorar os 5 anos da "Constituição da Internet", o InternetLab lançou o especial "Marco Civil 5 Anos". Durante todo o mês de abril a entidade publicará entrevistas e debates sobre diferentes temas em que o Marco Civil tocou e produziu efeitos:

  1. Poder Público e o Marco Civil: as diretrizes para atuação do Estado trazidas pelo Marco Civil, como as que priorizam os instrumentos de participação, universalização de acesso à internet, racionalização da gestão pública e transparência;
  2. Princípios e direitos ligados à privacidade, como a exigência de consentimento e de ordem judicial para a entrega de dados de usuários de internet;
  3. Violência de gênero, em especial o impacto da regra do Marco Civil que trata da disseminação não consensual de imagens íntimas;
  4. A regra da neutralidade da rede trazida pelo Marco Civil;
  5. Direito autoral: excluído das previsões do Marco Civil da Internet nos momentos finais de tramitação, as regras aplicáveis à proteção de direitos autorais na internet seguiram sendo definidas pelos tribunais, e as novidades no debate mundial.
  6. Bloqueios de aplicativos, sanções e aplicação da jurisdição brasileira;
  7. Liberdade de expressão e o modelo de responsabilização de plataformas de internet por conteúdos gerados por seus usuários.

Muito desses conteúdos lançam luz sobre pontos da lei considerados basilares para o futuro da Internet no país. E explicam por que muitos dos PLs que tentam alterá-la devem ser acompanhados de perto por toda a sociedade brasileira.

Sobre a autora

Cristina De Luca é jornalista especializada em ambiente de produção multiplataforma. É diretora da ION 89, startup de mídia com foco em transformação digital e disrupção. Foi diretora da área de conteúdo do portal Terra; editora-executiva da área de conteúdo da Globo.com; e editora-executiva da unidade de Novos Meios da Infoglobo, responsável pela criação e implantação do Globo Online. Foi colunista de tecnologia da Rádio CBN e editor-at-large das publicações do grupo IDG no Brasil. Master em Marketing pela PUC do Rio de Janeiro, é ganhadora do Prêmio Comunique-se em 2005, 2010 e 2014 na categoria Jornalista de Tecnologia.

Sobre o blog

Este blog, cujo nome faz referência à porta do protocolo Telnet, que é o protocolo de comunicação por texto sem criptografia, traz as informações mais relevantes sobre a economia digital.