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Cristina de Luca

MP arquiva inquérito contra a startup InLoco por coleta indevida de dados

Cristina De Luca

21/02/2020 09h20

A Comissão de Proteção de Dados Pessoais do MPDFT (Ministério Público do Distrito Federal e Territórios) arquivou, nesta quinta-feira (20/2), um inquérito de 2018 que investigava a empresa de localização In Loco pela obtenção de dados pessoais de 60 milhões de celulares brasileiros. A decisão da 6° Câmara de Coordenação e Revisão da Ordem Jurídica Cível Especializada do Ministério Público do Distrito Federal (MPDFT), determinando o arquivamento do inquérito, foi unânime.

A empresa criou um sistema de geolocalização de ambientes internos e externos, 30 vezes mais exato que o GPS, usado hoje para autenticação de clientes em plataformas digitais e para marketing direcionado. O inquérito do MPDFT era baseado na regulamentação do Marco Civil da Internet, e investigava a coleta e o uso dos dados dos usuários para o envio de informações com base em geolocalização.

O Promotor de Justiça Frederico Meinberg Ceroy determinou o arquivamento do procedimento, por entender que a empresa exerce um modelo de negócio que está em conformidade com a legislação vigente, uma vez que não há coleta de dados que permita a vinculação direta ao titular dos dados pessoais.

Por meio de documentos como o DPIA (Data Protection Impact Assessment), a empresa detalhou a tecnologia, processos e produtos desenvolvidos a partir do princípio privacy by design muito antes de a Lei Geral de Proteção de Dados consagrá-lo como requisito para proteção da privacidade.

"Como In Loco, temos o propósito de aliar a conveniência da Internet com a privacidade a que todo cidadão tem direito. Isso nos fez enxergar o processo de investigação como um ato extremamente legítimo e necessário do poder público", afirma André Ferraz, CEO da In Loco. "De nossa parte fizemos o que defendemos: transparência para mostrar que trabalhamos os dados com extrema responsabilidade preservando a privacidade dos consumidores e a legitimidade do nosso compromisso com nossos clientes", completa.

"Decidimos trabalhar em uma solução que pudesse resolver o problema de privacidade na Internet, aliando dois conceitos aparentemente conflitantes, a conveniência e a anonimização. Nunca coletamos dados de identificação civil nem cruzar as informações que coletamos com as de bases de dados externas", conta André.

Criada em 2011, a empresa passou os dois primeiros anos participando de uma série de competições de startups. No primeiro aporte, foi avaliada um pouco abaixo do que André imaginava, mas sete vezes mais do que a proposta inicial do fundo. Valor que levou a Junta Comercial de Recife a questionar o investimento várias vezes, sem aceitar que um grupo de oito universitários pudesse valer tanto. O processo emperrou e o investimento só foi cair na conta no início de 2013.

A partir daí foi arregaçar as mangas. Em 2014, o primeiro produto chegou ao mercado, e a ideia de criar produtos sensíveis ao contexto baseados em geolocalização escalou. Hoje a empresa atende diversos segmentos que vão do varejo à indústria de aplicativos O2O (on-line to off-line). Suas soluções estão presentes em 600 aplicativos parceiros, com mais de 25 milhões de endereços mapeados no mundo e um bilhão de visitas registradas mensalmente.

A meta é chegar a 120 milhões de celulares até meados desse ano, 50 milhões deles nos Estados Unidos, onde a empresa abriu uma subsidiária no ano passado, depois de uma nova rodada de investimento, Serie B, com aporte de 20 milhões de dólares para acelerar seus planos de expansão internacional, liderado pelos fundos Valor Capital Group (CargoX, Gympass, Pipefy e Stone Pagamentos) e Unbox Capital (fundo de Luiza Helena Trajano, do Magazine Luiza).

"Mas nosso foco continua sendo a criação de uma plataforma para autenticação dos dispositivos e das aplicações de IoT, em deslocamento, que reconheça os usuários sem identificá-lo. Não vamos nos afastar um centímetro dessa meta de longo prazo", comenta André. "Hoje trabalhamos com smartphones, mas vejo a nossa solução equipamento qualquer dispositivo IoT de uso pessoal. Ela será um misto de protocolo de segurança com aplicações habilitadas nesses dispositivos. Um protocolo baseado no comportamento, e não na identidade. Que mantenha o usuário anônimo e, ainda assim, agregue inteligência com base no contexto de uso das aplicações", diz o executivo.

André Ferraz, CEO da InLoco – Foto de Divulgação

Segundo André, o produto inicial, para publicidade, ajudou a empresa a provar ao mercado que era possível oferecer performance superior ao das plataformas existentes, sem obrigar o usuário a permutar a sua privacidade, a entregar a sua identidade.

"A cultura que se criou no Vale do Silício sobre privacidade, de entregar conveniência em troca de informações pessoais, é injusta e está com os dias contados. O preço da conveniência não deve ser a privacidade.
Com essa onda toda da Transformação Digital, a fome por dados aumentou. Muitas empresas ainda pensam que precisam de todo e qualquer dado. Isso não é necessariamente verdade. Precisamos de alguns dados específicos, que vão fazer a diferença para o negócio. Todo o resto é lixo", afirma ele.

André acredita que a grande pergunta que as empresas devem se fazer diariamente é quais são os dados essenciais para o seu negócio. "Tudo o que não entrar nesse critério, melhor descartar", diz. O motivo? Cada dado adicional colocado para dentro é mais risco, tanto de compliance quanto reputacional.

"Nossa motivação foi encontrar maneiras de descrever uma pessoa, de forma inequívoca e autêntica, para que nenhuma outra pessoa possa se passar por ela, sem precisar saber nenhum dado de identificação civil dela. E explicar isso não é fácil", comenta.

Não mesmo. Tanto que muitas startups ainda se preocupam com a chegada da LGPD. A InLoco é um exemplo de que é possível prosperar sem "ter que quebrar todos os objetos da loja de cristais".

Sobre a autora

Cristina De Luca é jornalista especializada em ambiente de produção multiplataforma. É diretora da ION 89, startup de mídia com foco em transformação digital e disrupção. Foi diretora da área de conteúdo do portal Terra; editora-executiva da área de conteúdo da Globo.com; e editora-executiva da unidade de Novos Meios da Infoglobo, responsável pela criação e implantação do Globo Online. Foi colunista de tecnologia da Rádio CBN e editor-at-large das publicações do grupo IDG no Brasil. Master em Marketing pela PUC do Rio de Janeiro, é ganhadora do Prêmio Comunique-se em 2005, 2010 e 2014 na categoria Jornalista de Tecnologia.

Sobre o blog

Este blog, cujo nome faz referência à porta do protocolo Telnet, que é o protocolo de comunicação por texto sem criptografia, traz as informações mais relevantes sobre a economia digital.