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Direito ao esquecimento: STF terá que decidir entre privacidade e liberdade de expressão

Cristina De Luca

13/06/2017 09h11

A aplicação do direito ao esquecimento na esfera civil foi intensamente debatida em uma audiência pública realizada nesta segunda-feira pelo Supremo Tribunal Federal. Mais uma vez, a decisão dos ministro será entre dois direitos fundamentais previstos na da Constituição brasileira.  A causa em questão envolve uma controvérsia que opõe, de um lado, o direito ao esquecimento com base no princípio da dignidade da pessoa humana, inviolabilidade da honra e direito à privacidade e, do outro, a liberdade de expressão e de imprensa e o direito à informação.

No caso, que tem como relator o ministro Dias Toffoli, o STF foi acionado como último recurso contra um acórdão do TJ-RJ que nega reparação de danos a familiares da vítima de um crime de grande repercussão ocorrido no Rio de Janeiro na década de 1950. A família alega que o próprio tempo fez com que o crime fosse esquecido pela mídia e questiona sua reconstituição e utilização, sem autorização, em programa de TV (o Linha Direta, da Rede Globo. A família pede indenização pela exploração comercial desautorizada de imagem pública de uma pessoa morta.

Durante todo o dia, diversos especialistas expuseram seus pontos de vista, deixando claro que uma das questões fundo é a difícil, muitas vezes impossível, remoção de conteúdos da Internet. Não por acaso, a advogada Patrícia Peck, em seu perfil no LinkedIn, observou que a maioria dos participantes contrários ao direito ao esquecimento representa hoje empresas que detêm os recursos para remoção de conteúdo. Entre eles, Tais Borja Gasparian, representante da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Daniel Sarmento, representante da Associação Nacional de Jornais (ANJ) e da Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner)e Gustavo Binenbojm, representante da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert).

De fato, vieram deles os argumentos mais incisivos contra o apelo indiscriminado ao direito ao esquecimento. Na opinião de Gustavo Binenbojm, é "incontroverso" que a Constituição Federal e as leis infraconstitucionais não contemplam expressamente o direito ao esquecimento "como uma espécie de direito à amnésia coletiva ou à queima dos arquivos da sociedade". Segundo ele, o caso em questão foi julgado improcedente em todas as instâncias do Judiciário porque deixa evidente o direito da imprensa de veicular informações públicas. "Há um direito do público de se informar sobre esse episódio, lamentavelmente histórico, da nossa historiografia policial", afirmou.

O mesmo raciocínio embasou os argumentos de Taís Gasparian. Segundo ela, o sistema jurídico brasileiro não prevê o direito genérico de ser esquecido. Mas "a Constituição assegura o direito à informação, que só pode ser suspenso em situação excepcional, no estado de sítio. A Abraji tem o temor de que o STF venha por algum modo restringir o direito à liberdade de informação. À história cabe o que deve ou não ser lembrado", ressaltou. E foi além. Na opinião de Taís, a Internet é o templo da memória e retirar arquivos da rede seria o mesmo que queimar livros. "Interesse, poder e exclusão são ingredientes nefastos à memória de um povo. Os arquivos e os acervos servem para estabelecer uma identidade coletiva e de prova de fatos que muitas vezes são deliberadamente esquecidos pela versão oficial da história", disse.

O representante da ANJ reforçou a tese de ambos, ao defender que o esquecimento é antônimo da história. "É preciso conhecer o passado para não repetir os erros que a Humanidade cometeu. No Brasil, a questão nunca foi de excesso de memória, mas de amnésia coletiva", sustentou.

Coube ao professor Anderson Schreiber, do programa de pós-graduação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, representando Instituto Brasileiro de Direito Civil (IBDCivil), colocar os pontos nos iis. Segundo ele, o direito ao esquecimento não trata do direito de apagar fatos ou de reescrever a história, mas sim o direito de que a exposição pública de uma pessoa seja sempre feita de modo contextualizado e que seu passado não seja transformado em seu presente sem uma forte justificativa.

"Trata-se não de um direito contra a liberdade, mas um direito indispensável de assegurar a liberdade ao ser humano de seguir o próprio caminho ao longo da vida, sendo visto pela sociedade como quem realmente é", completou.

Segundo ele, o direito ao esquecimento não deve ser guiado pelo capricho ou pelo interesse do retratado de não ser lembrado contra sua vontade, ou seja, não pode se tornar um direito de propriedade sobre acontecimento pretéritos, de forma que a recordação pública dos fatos dependa unicamente da vontade de alguém envolvido no assunto. Tratado dessa forma, aí sim o direito ao esquecimento seria "flagrantemente" incompatível com a Constituição Federal, que tutela não só o direito à privacidade, mas também o direito de acesso da população à informação.

De acordo com o professor, essa versão voluntarista do direito ao esquecimento, sim, representa uma ameaça à pesquisa histórica e, especialmente, nas pesquisas na internet, pois permitiria a qualquer usuário moldar à sua vontade os resultados relativos à busca do seu nome ou a fatos públicos nos quais tenha se envolvido formando o que chamou de "uma internet de cada um".

"O direito ao esquecimento corresponde ao direito de uma pessoa de não ser perseguida pelos fatos do passado, que já não mais refletem sua identidade atual e impedem que seja publicamente reconhecido pelo que é", resume. E é sob este aspecto que o que o direito ao esquecimento é reconhecido em alguns países da Europa ocidental, como Itália e França. Um desdobramento do direito fundamental à privacidade.

Na opinião de Patrícia Peck, só a vítima que sofre todos os danos de não conseguir deixar no passado um conteúdo sabe como é importante a conquista deste direito no Brasil. "Mesmo que o conteúdo seja verdadeiro, ele já cumpriu com o propósito de informar quando foi publicado, em algum momento o passado", escreve a advogada.

E esse foi um ponto abordado pelo desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo e especialista em direito da personalidade, José Carlos Costa Netto. Na sua opinião, o direito ao esquecimento é relacionado à pessoa, não aos fatos. "Ninguém pode alterar os fatos, eles existem e podem ser divulgados ou não, mas a pessoa é quem quer ser esquecida", avaliou.

De acordo com o desembargador, o interesse aos direitos da personalidade surgiu com 2ª Guerra Mundial. Em razão dos regimes presentes à época, tais como stalinismo, fascismo, nazismo, já existia a vontade de proteger o cidadão quanto ao interesse público e a dignidade humana. Nesse sentido, o especialista observou que o direito de imagem, bem como os direitos à honra e à privacidade (intimidade) foram incluídos como direitos fundamentais, porque se verificou a existência de bens que deveriam ser, pela sua natureza, intransmissíveis e inalienáveis.

No entanto, de acordo com o especialista, há dois tipos de direitos da imagem: o atributo (lato sensu – sentido amplo) e o retrato (relacionado à fisionomia – rosto ou alguma característica específica). "O direito de imagem tem limitação quando, por exemplo, a pessoa sai da esfera da vida privada e vai para a vida pública. Essa é a forma não expressa e a expressa é quando a pessoa autoriza, por documento, a utilização da sua imagem", ressaltou.

Segundo ele, quando há o interesse público, ou seja, o interesse da comunidade, há uma atenuante em relação ao direito de imagem. Ele salientou que os relatos de fato são garantidos pela regra da Constituição quanto à liberdade de expressão. No plano intelectual, artístico ou científico, estão as hipóteses de relatos históricos, registros de acontecimentos, resenhas, crônicas e críticas jornalísticas, além de biografias. Não por acaso, Gasparian, representando a Abraji, lembrou na sua fala das decisões do Supremo na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4815, que decidiu pela desnecessidade de autorização para biografias não autorizadas.

Mas, defendendo o direito ao esquecimento, o professor Gustavo Mascarenhas Lacerda Pedrina, do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais (IBCCrim), lembrou que uma vez cumprida a pena, os fatos que cercam um ato criminoso precisam ser superados pela sociedade. "É da nossa Constituição a vedação expressa às penas de caráter perpétuo". O especialista explica que isso não significa dizer que a história seja esquecida. "No entanto, o pretexto da historicidade de um fato não pode significar permissão do abuso da dignidade humana. O direito de informar e a curiosidade pública não podem se confundir", disse.

Tempos atrás, conversando com o  advogado Paulo Sá Elias, me lembro dele ter dito que o Direito ao Esquecimento foi muito explorado pelo Direito Penal, no Brasil. O réu absolvido (não se distingue a fundamentação) tem o direito de o fato não ser objeto de conhecimento de terceiro, salvo com autorização judicial. O criminalista René Ariel Dotti, lembra em livros de sua autoria que "o suspeito, o indiciado ou o réu, é parte legítima para pedir a correção ou o silêncio de informações que contrariem a garantia constitucional da presunção de inocência (CF, art. 5.°, LVII)". O condenado tem o direito de cancelar, junto ao Instituto de Identificação ou outro órgão da estatística judiciária criminal (CPP, art. 809 e §§), as informações sobre o processo e a decisão após cumprida ou extinta a pena (Lei 9.210/84, art. 202).

Falta uma conceituação melhor do direito ao esquecimento
Durante a audiência pública desta segunda-feira, Binenbojm (foto) chamou atenção para a imprecisão conceitual e a indefinição dos limites do que seria o direito ao esquecimento. Ele questionou, por exemplo, quanto tempo terá que se passar para que alguém tenha o direito de impedir uma publicação sobre um fato relativo à sua biografia e quais seriam as circunstâncias históricas ou de interesse público que devem envolver o direito ao esquecimento.

"Certamente, cada especialista nessa sala terá uma opinião, cada juiz brasileiro terá uma visão. E a minha visão é de que essa é uma poção letal para o direito à informação na sociedade brasileira e em qualquer lugar do mundo", alertou.

Na opinião de Taís, os tribunais têm proferido decisões "erráticas" sobre o assunto. E um bom exemplo disso é o crescimento do número de processos com pedido de remoção de conteúdo na internet em anos eleitorais, "justamente quando as pessoas deveriam ter acesso às informações dos candidatos". Um estudo da Abraji revelou o oportunismo e a possibilidade da instrumentalização do Poder Judiciário que se pode ter nessas situações. "Se o direito ao esquecimento for acolhido pelo STF, dará vazão a esse tipo de solicitação", frisou.

Para Patrícia Peck,"todos os direitos, em alguma medida, são limitados uns pelos outros. O direito a privacidade é limitado da segurança, a própria liberdade é limitada pela privacidade. O importante é o equilíbrio de direitos". E essa será a dura tarefa do Supremo.

"É preciso que o STF estabeleça um parâmetro claro, impedindo que um suposto direito ao esquecimento seja invocado para impedir divulgação e discussão de fatos verídicos, apenas porque acontecidos no passado. O STF vem sendo um aliado importante das liberdades de expressão, informação e de imprensa, proferindo decisões belíssimas nesta área", ressaltou Gustavo Binenbojm.

Desnecessário?
Já Marcel Leonardi (foto) , advogado do Google Brasil, sustentou durante a audiência a opinião de que o direito ao esquecimento no Brasil é absolutamente desnecessário, pois o sistema jurídico já oferece os parâmetros necessários para que o Judiciário lide com as colisões de direitos fundamentais (privacidade e liberdade de informação) e efetue a ponderação caso a caso.

Segundo ele, a comunidade jurídica fora da União Europeia considera o direito ao esquecimento um equívoco e um insulto à memória e à história. Para Leonardi, o "suposto" direito ao esquecimento seria um nome elegante que muitas vezes é utilizado para efetuar a censura de conteúdo lícito e de informações verdadeiras.

O Google alerta para o fato do direito ao esquecimento se tornar um atalho para a eliminação de informações sem que haja a ponderação de direitos fundamentais e o estabelecimento de uma preponderância presumida da privacidade de modo genérico servindo como pretexto para todo pedido de remoção de conteúdo.

Leonardi afirmou que o direito ao esquecimento não é reconhecido em nenhum tratado ou convenção internacional de direitos humanos. Segundo ele, esse direito, da forma que está sendo proposto, é o equivalente à eliminação de informações, seja em sua fonte ou nos links que levem a ela. E lembrou que o Marco Civil da Internet e o Código Civil já oferecem soluções adequadas para pedidos de remoção forçada de conteúdo.

Na minha opinião, o assunto é controverso e, assim como o emprego da criptografia, requer um debate mais aprofundado. O que vale mais, a privacidade ou a liberdade de expressão? Elas não deveriam andar juntas? É possível encontrar um equilíbrio sem transformar a mídia em censora ou advogada de acusação?

O direito ao esquecimento não dá a ninguém o direito de reescrever a própria história. Mas também não devemos negar a ninguém o direito a um recomeço.

Então, como determinar quem tem direito ao esquecimento?

Antes de mais nada é preciso lembrar que o Direito ao esquecimento "consiste na faculdade de a pessoa não ser molestada por atos ou fatos do passado que não tenham legítimo interesse público".

Anterior à decisão do tribunal europeu e à aprovação do Marco Civil da Internet, o Enunciado 531, do Centro de Estudos do Judiciário do Conselho da Justiça Federal (CJE/CJF), já afirmava que o direito ao esquecimento não deve garantir a ninguém a prerrogativa de apagar fatos ou reescrever a própria história. Deve apenas assegurar a possibilidade de se discutir o uso que será dado a fatos pretéritos. Mais especificamente o modo e a finalidade com que serão lembrados.

Gustavo Binenbojm ressalta que nem sempre é possível distinguir, de antemão, os dados que se tornarão irrelevantes e poderão ser descartados, daqueles que serão essenciais à preservação da memória coletiva e da historiografia social. "O passado não é o que passou, mas o que ficou do que passou", diz ele.

Diante deste cenário, personalidades públicas, como políticos, podem pretender que determinados fatos de suas vidas sejam esquecidos? Muitos dirão, com absoluta certeza, que não.

Alguém que cumpriu pena e quitou sua dívida com a sociedade tem o direito de dissociar seu nome do crime cometido no passado? Outros tantos dirão que não, também.

Parece simples discernir quando aplicar o direito ao esquecimento, não é mesmo? Não…

No Brasil, por exemplo, dois anos após o cumprimento da pena ou da extinção da punibilidade por qualquer motivo, o autor do delito tem direito à reabilitação. Depois de cinco anos, afasta-se a possibilidade de considerar-se o fato para fins de reincidência, apagando-o de todos os registros criminais e processuais públicos.

A pessoa que pratica atos ilícitos ou reprováveis moralmente no passado, mas passa a ter uma vida honesta e exemplar, tem direito ao esquecimento, uma vez que errar faz parte da natureza humana. Mas se continuar a ter uma conduta reprovável…

Anos atrás, em um debate sobre direito digital no Insper, a advogada Juliana Abrusio, deu a todos os presentes uma verdadeira aula sobre o princípio do direito ao esquecimento. Segundo ela, o direito ao esquecimento é o direito de ver apagadas certas informações que, no passado, foram divulgadas legitimamente e licitamente, mas que com o passar do tempo deixaram de ser de interesse público ou histórico, continuando a atingir a dignidade da pessoa, comprometendo a sua vida em sociedade.

Conteúdos que associem o nome ou a imagem de alguém a um crime do qual essa pessoa tenha sido absolvida, inocentada, com trânsito em julgado, cabem nessa definição? Embora controverso, o entendimento que prevalece no texto do PL 215/15 é o de que sim, cabem.

E, nesse caso, como exercer o direito ao esquecimento?

Há quem advogue que, na Internet, ele se aplique, única e exclusivamente, à supressão de links que levem a conteúdos publicados durante o processo no qual a pessoa absolvida tenha sido arrolada como réu, jamais à remoção dos próprios registros jornalísticos e históricos. Apagar os registros seria censura incompatível com o Estado Democrático de Direito. Mas a mera supressão do link, em muitos casos, já não é por si só uma censura? Afinal, a fonte mais relevante de informação sobre um indivíduo está nos buscadores, certo? E também nas redes sociais.

Muitos advogam que pedidos de remoção de registros jornalísticos e históricos devam ser analisados caso a caso, levando-se em conta a finalidade de se relembrar fatos antigos e a pertinência disso para o debate público. E que somente registros suprimidos por seus autores sejam removidos dos mecanismos de busca.

A Diretiva 95/46/CE, que regulamenta o tratamento de dados pessoais na União Europeia, garante o direito de retificação e até a remoção de informações inverídicas, incorretas ou incompletas. A norma, no entanto, não estabelece o direito de apagar notícias verdadeiras. Afinal, o direito ao esquecimento não pode impedir o exercício do direito à memória.

Muitos defensores das liberdades de expressão e informação na rede defendem que o direito ao esquecimento seja decidido única e exclusivamente por decisões judiciais, após julgado o mérito da questão. E, nesse ponto, a decisão do Supremo no caso em questão pesará bastante.

O Congresso também pode dar pitaco
No Brasil é comum o conceito do direito ao esquecimento ser considerado uma consequência do direito constitucional à privacidade (art. 5º, X). A interpretação já era essa desde antes da decisão do tribunal europeu. Por conta disso, o direito ao esquecimento é invocado em muito processos contrapondo os direitos à imagem e à vida privada aos direitos à plena liberdade de expressão e de informação.

É essa interpretação do conceito (uma consequência do direito à vida privada, intimidade e honra) que impera no texto final do Projeto de Lei 215/15, batizado de #PLEspião, parado na Câmara dos Deputados aguardando apreciação do Plenário.

amplia disposições do artigo 19º do Marco Civil da Internet, comprometendo seu objetivo de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, ao incluir o parágrafo 3º-A e modificar a redação do parágrafo 4º.

Diz o Marco Civil que o o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário. O parágrafo terceiro garante que "causas que versem sobre ressarcimento por danos decorrentes de conteúdos disponibilizados na internet relacionados à honra, à reputação ou a direitos de personalidade, bem como sobre a indisponibilização desses conteúdos por provedores de aplicações de internet, poderão ser apresentadas perante os juizados especiais".

Se aprovado como está o #PLESpião estende o texto do Marco Civil da seguinte forma:

"§ 3º-A – O interessado ou seu representante legal poderá requerer judicialmente, a qualquer momento, a indisponibilização de conteúdo que associe o seu nome ou imagem a crime de que tenha sido absolvido, com trânsito em julgado, ou a fato calunioso, difamatório ou injurioso.

§ 4º – O juiz, inclusive no procedimento previsto no § 3º e § 3º-A, poderá antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, havendo prova inequívoca do fato e considerado o interesse da coletividade na disponibilização do conteúdo na internet, desde que presentes os requisitos de verossimilhança da alegação do autor e de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.

Desde a aprovação do Marco Civil, especialistas em direito digital advogam a necessidade de uma ponderação aprofundada e cuidadosa, para que a restrição de conteúdos não seja feita sem qualquer critério, ferindo a liberdade de expressão. Muitos acusam o Marco Civil de ter simplificado demais o processo ao incluir a possibilidade de recurso a juizados especiais. O que o #PLEspião tenta fazer é facilitar ainda mais as possibilidades de pedidos remoção, incluindo entre eles os pedidos de remoção de conteúdos referentes a processos (ainda sem julgamento) por calúnia, difamação e injúria.  E tome liminar…

Perdeu o fôlego? Pois é…

A discussão vai longe! E implica até mesmo a impossibilidade técnica de retirar conteúdos da Internet, em muitos casos.

Durante a audiência, Pablo de Camargo Cerdeira, representando o Centro de Tecnologia e Sociedade da Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro (CTS/FGV), observou que nos dias de hoje há uma realidade completamente diferente em que qualquer pessoa produz conteúdo, tira foto com o celular, grava informações, coloca em uma rede social, em um blog ou em qualquer ambiente de distribuição, isto é, o armazenamento é feito de forma dispersa.

"Quando uma pessoa salva dados no Google ou no Facebook pode ser que o datacenter esteja em qualquer outro país. Assim, como cumprir decisões relacionadas à obrigação de remoção de conteúdos que estão espalhados em todos os países do mundo?", questionou, ao acrescentar que nesses casos também poderia ser cerceado o direito de informação de outra pessoa.

De acordo com o professor, está em jogo a efetividade das decisões que reconheçam o direito ao esquecimento de maneira ampla ou restrita. "Em casos de crimes muito violentos, eu não tenho dúvida que, se o Judiciário determinar a retirada de conteúdo, isso deve ser feito. Os atores envolvidos farão seus maiores esforços para impedir que esse conteúdo circule, mas determinar que sutilezas em relação ao conteúdo de um fato determinado sejam retiradas é algo que vai além das possibilidade de filtrar conteúdo na Internet", avaliou.

Foi acompanhado no questionamento da efetividade das decisões de remoção pelo diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio), professor Carlos Affonso Pereira de Souza, para quem, na Internet, "a lembrança é a regra, e o esquecimento é a exceção".

O diretor do ITS Rio enfatizou ainda que a tentativa de retirada de algo dos meios de comunicação pode causar efeito contrário. "Lembramos mais daquilo que forçosamente temos que esquecer".

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Sobre a autora

Cristina De Luca é jornalista especializada em ambiente de produção multiplataforma. É diretora da ION 89, startup de mídia com foco em transformação digital e disrupção. Foi diretora da área de conteúdo do portal Terra; editora-executiva da área de conteúdo da Globo.com; e editora-executiva da unidade de Novos Meios da Infoglobo, responsável pela criação e implantação do Globo Online. Foi colunista de tecnologia da Rádio CBN e editor-at-large das publicações do grupo IDG no Brasil. Master em Marketing pela PUC do Rio de Janeiro, é ganhadora do Prêmio Comunique-se em 2005, 2010 e 2014 na categoria Jornalista de Tecnologia.

Sobre o blog

Este blog, cujo nome faz referência à porta do protocolo Telnet, que é o protocolo de comunicação por texto sem criptografia, traz as informações mais relevantes sobre a economia digital.