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Por que a economia digital deseja tanto o 5G?

Cristina De Luca

25/02/2019 21h02

Esta semana, acontece em Barcelona mais uma edição anual do Mobile World Congress (MWC), o maior evento mundial da indústria especializada em comunicações móveis. E, esse ano, uma sigla começa a despontar entre as estrelas do evento: 5G. Ela faz referência à quinta geração da telefonia móvel. Mas, na prática, é bem mais que isso.

É comum ouvir das empresas fornecedoras de equipamentos de infraestrutura de rede e de dispositivos que as quatro primeiras gerações da telefonia móvel representaram evoluções tecnológicas, que endereçaram problemas e oportunidades na prestação dos serviços de comunicação. O 5G não. A promessa é a de que ele seja uma verdadeira revolução, não só para a indústria de telecom.

"De 1G para o 2G o problema era a capacidade da rede. A rede 1G ainda era analógica. A 2G foi a primeira rede digital, e ela oferecia maior capacidade para a oferta do serviço celular", explica Roberto Jacques de Medeiros, diretor de produto da Qualcomm no Brasil. "Do 2G para ao 3G a grande mudança foi a demanda por conexões internet  para smartphones, tablets e notebooks a partir das redes das operadoras móveis. Por fim, do 3G para o 4G o problema resolvido foi o da velocidade das conexões. "O 4G possibilitou a oferta da tão sonhada banda larga móvel", explica o executivo.

"Agora, a transição do 4G para o 5G tem um objetivo mais amplo: levar a plataforma móvel, que é a maior em volume de conexões do mundo pra prover conexão para outras indústrias, além puramente da indústria de telecomunicações", diz o Roberto. Junto com a Inteligência Artificial e a Internet das Coisas, o 5G será a base dos futuros serviços digitais, oferecendo velocidades reais 10 a 20 vezes mais rápidas que as do 4G hoje e uma latência muito menor – de cerca de 20 milissegundos atualmente para um milissegundo com o 5G.

Portanto, a adoção do 5G não trata somente de dar aos nossos smartphones conexões melhores, do ponto de vista de qualidade, maiores, em relação à capacidade de tráfego, ou mais rápidas, em relação às velocidades de transmissão. Ela possibilita o surgimento de muitos novos serviços e casos de uso, capazes de impactar praticamente todos os aspectos de nossas vidas.

As empresas de telecomunicações dizem que o 5G viabilizará a chegada de carros autônomos seguros, transmissões de realidade virtual, a realização de cirurgia a longas distâncias, videochamadas holográficas 3D, robôs conectados e muitas outras operações de missão crítica, que requerem conexões com disponibilidades de 99,999% .

A figura abaixo mostra os três pilares do 5G.

A Ericsson espera que 40% da população mundial tenha acesso aos serviços 5G até o final de 2024, com 1,5 bilhão de conexões esperadas para usar a nova tecnologia de rede até essa data.

"Vamos ver mais coisas conectadas", disse o presidente e CEO da Ericsson, Börje Ekholm . "E a fragmentação no lado do dispositivo será maior. Hoje o smartphone é o centro do ecossistema. Isso será diferente em um mundo de 5G , diz o executivo.

Essa semana, em Barcelona, a indústria estará debatendo os benefícios que o 5G trará, os riscos que precisam ser mitigados, quem está liderando e quem está atrasado na implantação do 5G (o Brasil entre eles, infelizmente), e as regras para construir e operar redes 5G, a partir dos padrões estabelecidos pela 3GPP no ano passado.

Um pouco de explicações técnicas
Na prática, as redes 5G foram projetadas para usar ondas de alta frequência (no espectro entre 30 e 300 GHz, conhecidas como espectro de "ondas milimétricas"). No entanto, elas não viajarão para tão longe como as ondas de baixa frequência usadas com o 4G, e terão dificuldade em contornar obstáculos como paredes, edifícios etc. Por esta razão, as operadoras precisarão instalar uma quantidade maior de mini antenas para obter a mesma cobertura que o 4G. Em muitos casos, o 5G substituirá as redes domésticas de WiFi, oferecendo velocidades mais altas e uma melhor cobertura. Em outros, eles coexistirão.

"O problema não será a quantidade de antenas. O problema será equacionar as frequências para determinadas necessidade de cobertura e capacidade", comenta Rafael Steinhauser, presidente da Qualcomm para América Latina.

Até por que, construir antenas e torres de 5G em todo o lugar e muito perto dos usuários será um processo demorado e caro, fazendo com que, inicialmente, a disponibilidade do 5G seja muito desigual em todo o mundo.

Portanto, para garantir o máximo retorno do investimento da 5G, muitos fornecedores já trabalham com a possibilidade de terem soluções que aproveitam muito da estrutura física de equipamentos já instalado nas operadoras. Apenas os rádios teriam que ser trocados. Seria uma forma de acelerar a entrada em operação das redes 5G, ainda sem toda a capacidade prometida. O objetivo atual dos fornecedores é fazer com que as operadoras possam continuar evoluindo suas redes de 4G enquanto ativam o  5G de maneira inteligente e dinâmica.

Umas das possibilidades é iniciar o uso do 5G na última milha, como uma alternativa para a fibra óptica.

Sopa de letrinhas
Por isso, não se assuste se por acaso topar por aí com nomenclaturas como 4.5G, FWA,Giga Bit LTE, 5G NR, 5G NSA e 5G SA. São todas tecnologias de rede que coexistirão nos próximos anos, até que a infraestrutura 5G SA esteja em plena operação.

O lançamento inicial da infraestrutura celular 5G se concentrará em banda larga móvel aprimorada (eMBB) para fornecer maior largura de banda de dados e confiabilidade de conexão através de duas novas faixas de frequência de rádio:

 1- A Faixa de Freqüência 1 sobrepõe e estende as freqüências 4G LTE, operando de 450 MHz a 6.000 MHz. Bandas são numeradas de 1 a 255 e isso é comumente referido como novo rádio (NR) ou sub-6GHz (usado pela Qualcomm).

2 – A Faixa de Freqüência 2 opera em um nível muito maior de 24,250 MHz (~ 24GHz) a 52,600 MHz (~ 52GHz). As bandas são numeradas de 257 a 511 e isso é comumente referido como onda milimétrica (mmWave), mesmo que estritamente falando o comprimento de frequência 'milímetro' comece em 30 GHz.

Nem toda a faixa de freqüência mais alta será usada, pois as zonas de freqüência disponíveis diferem entre os países, de modo que diferentes sub-fatias estarão disponíveis. Isso representará um enorme desafio técnico para o design de smartphones (ou especificamente, projetistas de modem 5G).

Lembra quando muitos iPhones não funcionavam em 4G no Brasil, por que o nosso 4G operava em uma frequência diferente da usada nos EUA? E cada vez que se ia comprar um smartphone 4G no exterior era preciso ficar de olho nas letras que designavam os intervalos de frequência operacionais no Brasil? Pois é… É por aí…

Nesse momento, o grande dilema do Brasil ainda é o de alocação das frequências para o 5G. O país não só não sabe quando fará o leilão para alocação do espectro, como ainda estuda quais faixas de frequência liberar.

A tendência por aqui  é adotar somente faixas regulamentadas pela Citel (Comissão Interamericana de Telecomunicações), como é o caso da de 3,5 Ghz que, em teoria, já poderia ser leiloada este ano. Mas há a possibilidade de o país adotar também a faixa de 26 Giz (no lugar da  de 28Ghz, escolhida por diversos países, como Japão e EUA, que aqui é ocupada por alguns serviços via satélite). Como ela ainda não está regulamentada pela Citel (o que só deve acontecer depois de novembro deste ano, após a realização da Conferência  Mundial de Telecomunicações ), um leilão envolvendo as duas frequências pode acontecer somente em 2020.

Este ano, muitas operadoras (fala-se em mais de 20) colocarão em operação redes 5G NSA (que dependem da infraestrutura do 4G). As redes 5G SA, que de fato entregarão toda a promessa do 5G para o desenvolvimento da economia digital, só deverão estar disponíveis a partir de 2020. Será que conseguiremos tirar o atraso e pular logo para a 5G SA? Vai depender da capacidade de investimento das nossas operadoras e das regras que a Anatel definirá para o leilão das frequências.

Indutor de atividade econômica
O fato é que o 5G está no centro de uma mudança tecnológica global – com novas oportunidades, novas eficiências e novos modelos de negócios. Que vai muito além do setor de telecomunicações. É uma mudança para toda a nossa sociedade.

"Precisamos garantir que outras indústrias, governos e pessoas confiem na segurança e integridade de nossas redes. E devemos fazer tudo isso contra um cenário geopolítico complicado e mutante", comenta o presidente da Ericsson em um artigo recente.  Nos últimos meses, o 5G se transformou em mais um campo de batalha na guerra comercial entre os Estados Unidos e a China. 

Em Barcelona, as empresas chinesas, ZTE e Hauwei brilham nos debates sobre o 5G. Países e operadoras europeias têm tratado os pedidos dos EUA para que seus aliados políticos e econômicos descartem o uso dos  equipamentos para redes 5G dsa companhias chinesas com cautela.

Hoje, o CEO da Vodafone disse que proibir a Huawei pode atrasar o lançamento do 5G na Europa mais dois anos.

A Huawei, a finlandesa Nokia e a sueca Ericsson são as três maiores fornecedoras de equipamentos de telecomunicações do mundo, respondendo por mais da metade das receitas do mercado, segundo a empresa de pesquisa Dell'Oro Group.

O CEO da Vodafone disse que há "alta competição" entre os três fornecedores de equipamentos, mas acrescentou que a Huawei possui "tecnologia de ponta". Em uma mesa redonda com a mídia, ontem, em Barcelona, ​​o atual presidente da Huawei, Guo Ping, afirmou que a empresa está 12 meses à frente de seus concorrentes quando se trata de tecnologia 5G.

Os americanos temem que a China não só use a infraestrutura de rede para espionagem, como também para ampliar o seu domínio sobre a Internet.

Hoje, jornalistas brasileiros presentes no Mobile World Congress ouviram do vice-presidente da área de setor governamental e utilities públicas da Huawei Enterprise, Edwin Diender, que a Huawei não usa backdoor(espionagem) em seus produtos. "Não, não usamos backdoor. Nossa preocupação de segurança é semelhante a de qualquer provedor de tecnologia. Nós fazemos a solução, testamos e a entregamos para quem compra, que define a configuração", sustentou.

Em Washington, o Congresso e a Inteligência alertam que Pequim poderia usar equipamentos de rede para espionar e expandir sua influência sobre a Internet.

Hoje, 11 senadores enviaram uma carta a altos funcionários os departamentos de Energia e Segurança Interna recomendando que equipamentos chineses sejam banidos de toda a infraestrutura crítica do país,  como os sistemas elétricos.

Os autores da carta, incluindo o secretário do DHS, Kirstjen Nielsen, e o secretário de Energia, Rick Perry, dizem que os produtos de rede solar "inteligentes" da Huawei, que incluem "inversores" capazes de se conectar à rede elétrica mais ampla, representam um perigo para a infraestruturas críticas dos EUA."

Em breve, o 5G se tornará uma infraestrutura  tão crítica quanto a própria rede elétrica, sustenta Rafael Steinhauser, presidente da Qualcomm para América Latina. 

Rafael é um dos muitos técnicos e pesquisadores que prevêem que o 5G se tornará uma "tecnologia de propósito geral", e isso é importante porque os GPTs são a base para grandes ondas de crescimento econômico. Alguns GPTs do passado incluem:

  • Peças intercambiáveis ​​e produção em massa
  • Aeronaves militares e comerciais
  • Energia nuclear
  • Computadores e semicondutores
  • A Internet
  • As indústrias espaciais

Outros podem ser mais seletivos e citar a eletricidade e a tecnologia da informação como tecnologias de propósito geral muito importantes. O motor a vapor e a eletricidade também são vistos como GPTs. Alguns citam ainda a linguagem falada, a roda, a linguagem escrita, a prensa, as ferrovias, os automóveis e a produção em massa. Poucos observadores, no entanto, citam "comunicações" como uma GPT. Mas como o 5G vai além das comunicações…

Se realmente se tornar a GPT da economia digital, talvez em 2035 o 5G possa gerar cerca de US $ 12 trilhões em atividade econômica global. A cadeia de valor global 5G gerará US $ 3,5 trilhões em produção e apoiará 22 milhões de empregos até lá. Além disso, de 2020 a 2035, a contribuição total de 5G para o PIB global real será equivalente a uma economia do tamanho da Índia – atualmente a sétima maior economia do mundo, segundo um estudo da Qualcomm.

A ver.

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Sobre a autora

Cristina De Luca é jornalista especializada em ambiente de produção multiplataforma. É diretora da ION 89, startup de mídia com foco em transformação digital e disrupção. Foi diretora da área de conteúdo do portal Terra; editora-executiva da área de conteúdo da Globo.com; e editora-executiva da unidade de Novos Meios da Infoglobo, responsável pela criação e implantação do Globo Online. Foi colunista de tecnologia da Rádio CBN e editor-at-large das publicações do grupo IDG no Brasil. Master em Marketing pela PUC do Rio de Janeiro, é ganhadora do Prêmio Comunique-se em 2005, 2010 e 2014 na categoria Jornalista de Tecnologia.

Sobre o blog

Este blog, cujo nome faz referência à porta do protocolo Telnet, que é o protocolo de comunicação por texto sem criptografia, traz as informações mais relevantes sobre a economia digital.